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segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Principais Comportamentos de uma Pessoa com Transtorno de Personalidade Antissocial


Principais Comportamentos de uma Pessoa com Transtorno de Personalidade Antissocial
(Tempo de leitura: 8 - 16 minutos)

Resumo: Neste artigo, pretende-se abordar os principais comportamentais de pessoas com transtorno da “Personalidade Antissocial”. O trabalho apresenta uma breve revisão teórica dos conceitos e características comportamentais, utilizando-se de uma literatura direcionada aos comportamentos que surgem nos sujeitos portadores deste transtorno.
Palavras-chave: Transtorno da Personalidade Antissocial, Terapia Cognitiva, Características Comportamentais de um Antissocial.

1. Introdução

O tema que será abordado nos leva a pensar o quanto a mente humana é misteriosa e instigante para estudos que se estendem há séculos e possivelmente seguirão por anos a fio. A personalidade de um ser humano é constituída de características peculiares e se desenvolve para os traços biopsicossociais, possibilitando conceituar a unicidade do ser. As características, que se aprimoram por toda a vida, dependerão das estimulações que recebem dos contextos vivenciados pelo sujeito.
O presente artigo faz uma abordagem panorâmica do transtorno antissocial que algumas pessoas desenvolvem nos vários setores da sociedade, e que, talvez em função do comportamento de dissimulação, característica própria do transtorno, é frequentemente negligenciado nas relações humanas.
O artigo apresenta uma breve visão dos comportamentos da psicopatia e em sua conclusão destaca a necessidade e a importância do cuidado de quem convive e necessita manter contatos com um psicopata.
Neste artigo pretende-se conceituar o que é psicopatia e sociopatia, apresentando as características peculiares dos transtornos, dando ênfase em como foi se instalando ao longo do tempo, as crenças profundas, os pensamentos e os comportamentos desenvolvidos pelo sujeito.
A percepção e os processos psicológicos de um psicopata são diferentes das outras pessoas, estes entendem o mundo ao seu redor de forma egocêntrica e egoísta, importando somente em satisfazer os seus desejos instintivos. A sua motivação é intensa na direção e persistência, com vistas à realização de uma determinada meta, mesmo que seja atropelando as pessoas a sua volta.
Neste raciocínio, o psicopata desenvolve sua personalidade com refinamento da inteligência racional, desenvolvendo habilidades em determinada área, com o intuito de dominar e fazer desta estratégia o uso do poder para se sobressair diante dos outros.
Na Psicologia, o estudo da personalidade começou a ser expressivamente estruturado na década de 1930, por meio das proposições de Gordon Allport, sendo que seu livro Personality: a psychological interpretation (Allport, 1937) oficializou o marco inicial do estudo da personalidade na ciência psicológica.
A personalidade como "a ordenação dinâmica daqueles sistemas psicofísicos que, no indivíduo, determinam as suas adaptações singulares ao meio ambiente", sublinhando-se assim, que a personalidade é "menos um processo acabado do que um processo progressivo". "Ela possui, sem dúvida alguma, características estáveis, mas encontra-se sujeita a modificações constantes" (Allport, 1937 p. 347).
Segundo observações clínicas por vários estudiosos, caracteriza-se como psicopata, um conjunto de comportamentos apresentados por uma personalidade fria, calculista e sem medo de ofender as outras pessoas. Observa-se também no comportamento, falta de autocontrole emocional e comportamental, falta de empatia, irresponsabilidade, impulsividade, dificuldade para estabelecer vínculos interpessoais por congelamento afetivo, falta de preocupação com os compromissos, ausência de remorso, procura de aventuras sensacionalistas e comportamento antissocial sem necessariamente cometer um delito (Hare, 1973, p.41).
Por conseguinte, Keysers, Rochele Kothe (p. 36), descrevem a empatia como uma conveniência comportamental:
[...] aparentemente, a empatia, para a maioria de nós, é um padrão. Se virmos uma vítima, partilhamos da sua dor. Para os criminosos psicopatas, a empatia parece ser uma atividade voluntária. Se eles quiserem, eles podem ter empatia, o que explicaria como eles podem ser tão charmosos e tão manipuladores. Uma vez que seduzem alguém, a empatia pode ir embora. Livres de restrições desse sentimento, nada pode impedi-los de usarem a violência. 
A psicopatia, assim como a sociopatia, geralmente começa a surgir na infância e na adolescência, mas o diagnóstico é fechado por volta dos 18 anos. O comportamento padrão é de desrespeito às normas sociais e às pessoas próximas. Segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM IV), classificação dos transtornos mentais feita pela Associação Americana de Psiquiatria, a pessoa que desenvolve o transtorno da personalidade antissocial tem como características principais o engodo e a manipulação. É um transtorno que afeta mais o sexo masculino, com possíveis influências genéticas. São indivíduos extremamente inteligentes na racionalidade, com certo entorpecimento na inteligência emocional, argumentativos, sedutores, charmosos e utilizam-se desta estratégia como mecanismos de sobrevivência para manter o lado sádico de sua personalidade.
Um sociopata é guiado por comportamentos considerados desviantes ou impróprios e até mesmo perversos em alguns casos, podendo assim causarem sofrimentos, enquadrados em ambos aspectos, para si mesmo e para a sociedade.
“Chamamos personalidades psicopáticas certos indivíduos que, sem perturbação da inteligência, inobstante não tenham sofrido sinais de deterioração, nem de degeneração dos elementos integrantes da psique, exibe através de sua vida intensos transtornos dos instintos, da afetividade, do temperamento e do caráter, mercê de uma anormalidade mental definitivamente pré-constituída, sem, contudo, assumir a forma de verdadeira enfermidade mental” (Croce; Croce Júnior, 2012, p. 666).
Geralmente a pessoa que desenvolve o transtorno antissocial, recebe uma pressão da sociedade, comunidade, familiares, professores ou dos cônjuges para que busque tratamento, devido a comportamentos indevidos ou relacionamentos interpessoais estressantes. Essa imposição também pode acontecer no trabalho e nas penitenciárias, porque, em muitos casos, a liberdade condicional dependerá do engajamento na psicoterapia.
Essas pessoas criam problemas para a sociedade, já que o transtorno é um padrão de desrespeito e violação aos direitos alheios (American Psychiatric Association, 2000, p.685).
“Mesmo que a psicopatia seja considerada uma patologia social (pelo sociólogo), ética (pelo filósofo), de personalidade (pelo psicólogo), educacional (pelo professor), do ponto de vista médico (psiquiátrico) ela não parece configurar uma doença no sentido clássico, sendo que atualmente há uma tendência universal de considerar os psicopatas como plenamente capazes de entender o caráter lícito ou ilícito dos atos que pratica e de dirigir suas ações (Trindade; Beheregaray; Cuneo, 2009)”.

2. Metodologia

O artigo foi desenvolvido com pesquisa bibliográfica, utilizando SCIELO (Scientific Eletronic Library Online) e outros artigos sobre o tema transtorno de personalidade Antissocial. Desse modo, presente estudo possui caráter descritivo, resumido com informações retiradas por meio de livros e periódicos de embasamento teórico, técnico-científico que se baseiam em saúde mental, em específico a psicopatologia do “Transtorno da Personalidade Antissocial”.

3. Sociopatia e a Teoria Cognitiva

A sociopatia é um transtorno da personalidade descrito no manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (DSM-5) como “transtorno de personalidade antissocial”. Esse distúrbio é definido como “uma condição mental na qual uma pessoa tem um padrão prolongado de manipulação, exploração ou violação dos direitos de outras pessoas”, segundo a Biblioteca Nacional de Medicina dos Estados Unidos.
Os axiomas formais da teoria cognitiva postulados por Beck (2000) são: a psicopatologia resulta de significados mal adaptativos construídos em relação ao self, ao contexto ambiental (experiência), e ao futuro (objetivos), que juntos são denominados de tríade cognitiva. Na raiva e no transtorno antissocial, o self é visto como sendo maltratado ou abusado pelos outros, e o mundo é visto como injusto e em oposição aos interesses da pessoa. A especificidade do conteúdo cognitivo está relacionada desta maneira a tríade cognitiva. Há dois níveis de significado: (a) o significado público ou objetivo de um evento, que pode ter poucas implicações significativas para um indivíduo; e (b) o significado pessoal ou privado. O significado pessoal, ao contrário do significado público, inclui implicações, significação, ou generalizações extraídas da ocorrência do evento. O nível de significado pessoal corresponde ao conceito de "domínio pessoal".
Neste sentido, o self se vê como solitário, autônomo e forte. Alguns se veem como maltratados pela família e sociedade e, portanto, faz sentido abusar e transgredir as normas e valores sociais. Geralmente, a visão que se tem dos outros é que eles são exploradores e merecem serem explorados ou que são subservientes e merecer serem vítimas. Seguindo este raciocínio, o sociopata ataca para não ser atacado e explora para não ser explorado. A principal crença desenvolvida pela sociopata é a seguinte: “eu tenho que atacar para não ser atacado”.
O comportamento observável do sociopata na sociedade se estende para a mentira, trapaça e enganação dos outros abertamente, sempre utilizando a sedução como estratégia para manipulação, para em sequência explorá-las e enganá-los.

4. Critérios Diagnósticos do Transtorno Antissocial

De acordo com o Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (DSM-5), as pessoas com transtorno de personalidade antissocial se caracterizam pelos seguintes critérios:
Pelo DSM-V
Critérios diagnósticos pelo DSM-V (Código: 301.7)
  • A. Um padrão perversivo de desrespeito e violação aos direitos dos outros, que ocorre desde a adolescência, como indicado por pelo menos três dos seguintes critérios:
  1. Fracasso em conformar-se às normas sociais com relação a comportamentos éticos e legais, indicado pela execução repetida de atos que constituem motivo de reprovação social ou detenção (crimes);
  2. Impulsividade predominante ou incapacidade em seguir planos traçados para o futuro;
  3. Irritabilidade e agressividade, indicadas por histórico constante de lutas corporais ou agressões verbais violentas;
  4. Desrespeito irresponsável pela segurança própria ou alheia;
  5. Irresponsabilidade consistente, indicada por um repetido fracasso em manter um comportamento laboral consistente ou honrar obrigações financeiras;
  6. Ausência de remorso, indicada por indiferença ou racionalização por ter manipulado, ferido, maltratado ou roubado outra pessoa;
  7. Tendência para enganar e à falsidade, indicada por mentir compulsivamente, distorcer fatos ou ludibriar os outros para obter credibilidade, vantagens pessoais ou prazer;
  • B. O indivíduo tem no mínimo 18 anos de idade.
  • C. Existem evidências de Transtorno de Conduta com início antes dos 15 anos de idade.
  • D. A ocorrência do comportamento antissocial não se dá exclusivamente durante o curso de Esquizofrenia ou Transtorno Bipolar.
Portanto, no diagnóstico do transtorno de sociopatia o indivíduo necessita ter no mínimo 18 anos de idade e preencher três dos critérios citados acima em um período de tempo considerado.

5. Características do Comportamento de um Sociopata

O sociopata não consegue desenvolver empatia nas relações humanas, ao contrário, o seu comportamento é vazio emocionalmente, frio e muitas vezes cruel. A arrogância se faz presente e a autossuficiência em seus investimentos comportamentais. Não considera o outro em seus projetos pessoais, sociais e de trabalho, e o seu lado narcisista impera diante da comunidade em que vive. Não se submete a qualquer investimento para não frustrar o seu ego, portanto, o seu investimento pessoal no campo da razão é intenso, justamente para não se submeter em ocupações que não merecem destaque na sociedade.
Seu papel de caçador de vítimas se estende para os vários setores da sociedade e a estratégia comportamental é a obstinação, a vaidade e a sedução de forma generalizada para explorar os relacionamentos e satisfazer o seu eu. Hare (2009), considerado a maior referência no assunto e autor do diagnóstico de psicopatia, cita:
“Eles andam pela sociedade como predadores sociais, rachando famílias, se aproveitando de pessoas vulneráveis, deixando carteiras vazias por onde passam”.
Vimos que uma pessoa que não demonstra empatia pelos outros merece muita atenção e cuidado nas relações humanas porque o seu interesse com a qualidade de vida do outro não existe. A pessoa com o transtorno antissocial possui baixa tolerância à frustração e muita impulsividade no comportamento, responsabiliza os outros e tenta intelectualizar suas condutas antiéticas. São egocêntricas e egoístas, não respeitam a individualidade do outro e não desenvolvem lealdade e solidariedade. Quanto aos seus projetos pessoais e profissionais, são desorganizadas e cheio de conflitos interpessoais por falsidade, calúnia e distorções de ideias das pessoas.
Segundo estudos realizados e publicados pela psiquiatra, Dra. Ana Beatriz B. Silva (2010, p. 44):
Os psicopatas têm total ciência dos seus atos (a parte cognitiva ou racional é perfeita), ou seja, sabem perfeitamente que estão infringindo regras sociais e por que estão agindo dessa maneira. A deficiência deles (e é aí que mora o perigo) está no campo dos afetos e das emoções. Assim, para eles, tanto faz ferir, maltratar ou até matar alguém que atravesse o seu caminho ou os seus interesses, mesmo que esse alguém faça parte de seu convívio íntimo. Esses comportamentos desprezíveis são resultados de uma escolha, diga-se de passagem, exercida de forma livre e sem qualquer culpa.
Segundo Farrington (2005), a definição de psicopatia sintetizada e utilizada nas pesquisas atuais é derivada das contribuições teóricas, originalmente propostas sobre o constructo e embasada em estudos empíricos. Envolve três importantes dimensões, além dos comportamentos antissociais em si, assim caracterizadas:
  1. Um estilo interpessoal enganador e arrogante, incluindo desinibição ou charme superficial, egocentrismo ou um senso grandioso de autoestima; mentira, trapaça, manipulação e enganação.
  2. Experiência afetiva deficiente, com pouca capacidade de sentir remorso, culpa e empatia; uma consciência fraca, insensibilidade, afeto superficial e falha em aceitar responsabilidade pelas ações (utilizando-se de negação, desculpas, etc.).
  3. Um estilo de comportamento impulsivo ou irresponsável, incluindo tédio, busca contínua por emoção, falta de metas em longo prazo, impulsividade, falha em pensar antes de agir e um estilo de vida parasita (tais como: dívidas, hábitos de trabalho insatisfatórios).
Pessoas com transtornos de personalidade antissocial são mentirosas e trapaceiam com facilidade e sem remorso. Conseguem manipular até mesmo quem estiver próximo para satisfazer o seu ego. São promíscuos na sexualidade e podem até maltratar animais sem piedade. São capazes de começar a participar de alguns grupos sociais, como por exemplo, religião, escola, clubes recreativos, justamente para ficar próximo às suas vítimas.

6. A Emoção de um Sociopata

Os sociopatas são absolutamente racionais, agem conforme os seus interesses, são frios em relação aos afetos. Hare (2009) cita:

Um psicopata ama alguém da mesma forma como eu, digamos, amo meu carro – e não da forma como eu amo minha mulher. Usa o termo amor, mas não o sente da maneira como nós entendemos. Em geral, é um sentimento de posse, de propriedade. Se você perguntar a um psicopata por que ele ama certa mulher, ele lhe dará respostas muito concretas, tais como “porque ela é bonita”, “porque o sexo é ótimo” ou “porque ela está sempre lá quando preciso”. As emoções estão para o psicopata assim como está o vermelho para o daltônico. Ele simplesmente não consegue vivenciá-las.
Silva (2008, p. 12) cita seu posicionamento a respeito dos psicopatas, expressando a respeito dos seus sentimentos:
”Os psicopatas em geral são indivíduos frios, calculistas, inescrupulosos, dissimulados, mentirosos, sedutores e que visam apenas o próprio benefício”.

7. Sociopatia e Psicopatia

Segundo o pesquisador Robert Hare, a diferença entre a sociopatia e psicopatia está ligada diretamente ao início que o transtorno se apresenta. Para ele, a sociopatia começa no meio ambiente, isto é, na sociedade, onde o indivíduo começa a cometer alguns delitos.
A psicopatia é diferente, possui ligação de fatores biológicos, genéticos e socioambientais. O indivíduo possui um traço inerente na personalidade com a junção desses fatores, formando a sua essência de personalidade, independente das influências do meio em que vive. Portanto, a sociopatia pende mais para as questões ambientais e a psicopatia para as questões genéticas próprio do indivíduo.
Robert Hare (2009):
 "É enorme o sofrimento social, econômico e pessoal causado por algumas pessoas cujas atitudes e comportamento resultam menos das forças sociais do que de um senso inerente de autoridade e uma incapacidade para conexão emocional do que o resto da humanidade. Para estes indivíduos - os psicopatas - as regras sociais não são uma força limitante, e a ideia de um bem comum é meramente uma abstração confusa e inconveniente". 

8. Psicoterapia

Segundo estudos desenvolvidos pela Psicologia , a psicoterapia mais indicada para tratar pessoas com transtorno de personalidade antissocial, é a Terapia Cognitivo-Comportamental. Constatou-se que pacientes submetidos a esta psicoterapia tiveram uma melhora em seus impulsos primitivos e passaram a pensar mais nas consequências de seus atos. Os pesquisadores alegam que a personalidade não mudou, porém, a reincidência caiu de 40 a 52% para 20 e 33% com pacientes com personalidade violenta em liberdade condicional.

9. Conclusão

Fica evidente que o tema abordado é muito complexo, requer um olhar cuidadoso dos psiquiatras e psicólogos clínicos para compreender e auxiliar indivíduos que desenvolveram o transtorno antissocial com o intuito de minimizar as consequências, auxiliando a sociedade a ficar alerta quanto a gravidade do mesmo. Nota-se, pelos estudos desenvolvidos, que por trás de toda atitude, existe uma intenção para satisfazer uma mente egoísta e egocêntrica.
Muito ainda se tem a compreender sobre psicopatia, sociopatia e os transtornos antissociais. Para isso, faz-se necessário desenvolver diagnósticos, prognósticos, tratamentos e continuar com trabalhos de pesquisa, estimulando novos pesquisadores. Com este estudo, ficou evidente que os investimentos necessitam ser intensificados, não somente na teoria, mas na prática clínica, a fim de proporcionar reestruturação psicológica, melhorando os indivíduos com este transtorno e alertando a sociedade para casos graves, com possibilidade de comportamentos psicopatológicos e delituosos.
Nota-se que, para alguns casos, o indivíduo com transtorno antissocial necessita colocar em prática os seus mais sórdidos desejos irracionais para a satisfação de um sadismo perverso. Os psicólogos merecem ficar atentos quanto ao diagnóstico, prognóstico e tratamento, sempre instrumentalizando sua ação com a humildade de buscar mais estudos, para compreender melhor esse tipo de personalidade.

Sobre o Autor:

Referências: 

American Psychiatric Association (APA). Psychiatric Diagnosis and the Diagnostic Statistical Manual of Mental Disorders (Fourth Edition – DSM-IV). Fact Sheet. 1997;1-4.
ALLPORT, G. W. (1937). Personality: a psychological interpretation. New York: Holt.
AZEREDO, S. D. Pressupostos da Terapia Cognitiva no Processo de Entendimento da Personalidade. 2002 disponivel em: http://www.saude.unisinos.br
CROCE, D. J, Delton C. Manual de Medicina Legal.8. ed. São Paulo: desarava, 2012. 
CAVALCANTI, Ana Elizabeth. Pequena história da psiquiatriaGrandes temas do conhecimento - Psicanálise, São Paulo: Mythos Editora. Edição nº 61.
FARRINGTON, D. P. (2005). The importance of child and adolescent psychopathy. Journal of Abnormal Child Psychology, 33(4), 489-497.
HARE, Robert. Psicopatia, Teoria e Pesquisa. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos S/A, 1973.
KAPLAN, H. B.; SADOCK, B. J.; GREBB, J. A. Compêndio de psiquiatria: Ciências do comportamento e psiquiatria clínica. Porto Alegre: Artes Médicas, 2003.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE (OMS) (Ed.). Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID -10: Descrições clínicas e diretrizes diagnósticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.
SILVA, Ana Beatriz Barbosa. Mentes perigosas: o psicopata mora ao lado. Ed. de bolso. Rio de Janeiro: Objetiva, 2010.
TRINDADE, Jorge. Psicopatia – A máscara da justiça/Jorge Trindade, Andréa
BEHEREGARAY, Mônica Rodrigues Cuneo. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Treinamento Cognitivo de Crianças Utilizando Jogos Digitais para o Aprimoramento de Funções Executivas: Revisão Sistemática da Literatura


Treinamento Cognitivo de Crianças Utilizando Jogos Digitais para o Aprimoramento de Funções Executivas: Revisão Sistemática da Literatura
(Tempo de leitura: 10 - 20 minutos)

Resumo: O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura sobre os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas na infância, incluindo trabalhos que os utilizam para o treinamento cognitivo ou avaliem os efeitos da interação com os jogos sobre o desempenho das habilidades que integram as funções executivas em crianças. O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados Eric, LILACS, ScienceDirect e Scielo por meio das seguintes palavras-chave: digital games AND executive functions; child AND games AND executive functions. Por meio das palavras-chave foram identificados 25 artigos nas bases de dados especificadas anteriormente, e de acordo com os critérios de inclusão e exclusão foram selecionados para análise 6 artigos. Entre os resultados encontrados a partir dos artigos selecionados, pôde-se concluir que os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas variam de acordo com o tipo de jogo utilizado, sendo a faixa etária de fundamental importância no desempenho da criança no jogo. Com essa revisão sistemática também pôde-se perceber que este é um tema pesquisado a pouco tempo, sendo o artigo mais antigo datado de 2012, e a maior parte do ano 2016.
Palavra-chaveJogos digitais; Funções executivas; Treinamento cognitivo; Infância.

Introdução

As funções executivas (FE) estão relacionadas às habilidades cognitivas envolvidas no planejamento, iniciação, seguimento e monitoramento de comportamentos complexos dirigidos a um fim, ou seja, na avaliação neuropsicológica, as FE podem ser utilizadas para indicar uma gama de funções cognitivas, entre elas a atenção, concentração, seletividade de estímulos, controle mental, planejamento, entre outras (Handam; Pereira, 2009). Segundo o dicionário Internacional Neuropsychological Society, as funções executivas podem ser definidas como: “as habilidades cognitivas necessárias para realizar comportamentos complexos dirigidos para determinado objetivo e a capacidade adaptativa às diversas demandas e mudanças ambientais” (Loring, 1999, p. 64).
Assim como afirmam Pessoa, Kastner e Ungerleider (2003), temos dentre as FE, a atenção como uma habilidade cognitiva muito considerada nos estudos da área, pelo fato de estar intimamente ligada ao uso dos jogos cognitivos e por envolver "a discriminação de um alvo relevante, a sensibilidade perceptual e a redução da interferência dos estímulos distratores". Em outras palavras, percebe-se uma positiva relação entre o quão fácil uma atividade parece ser e com que frequência essa atividade é realizada, sendo que, entre as várias modificações que ocorrem à medida que praticamos uma atividade com frequência, estão as reduções na carga de processos de atenção, bem como a habilidade de perceber e captar informações que podem ser relevantes para aquela tarefa. Para tal, nota-se que o "uso regular dos jogos pode constituir uma prática ou exercício dessa habilidade, influenciando diretamente na melhora desse processo cognitivo" (Boot et al., 2008; Weinstein, 2010), com isso, percebe-se que pessoas que jogam videogame possuem um melhor desempenho em uma série de capacidades cognitivas, tal qual atenção, processamento perceptual e funções executivas, quando comparados àquelas que não jogam (Boot et al., 2008; Weinstein, 2010).
 Enriquez-Geppert, Huster e Herrmann (2013), afirmam a utilização de softwares de treinamento para o desenvolvimento cognitivo apresenta impactos significativos em habilidades como memória de trabalho, atenção dividida e flexibilidade cognitiva, sendo adaptados para o contexto infanto-juvenil de forma a atribuir características lúdicas através do processo de gamificação (desenvolvimento de treinamentos cognitivos através do uso de videogames), o que aumenta significativamente a aderência dos usuários (Rivero; Querino; Starling-alves, 2012). Desse modo, faz-se necessário evidenciar a importância dos estudos com foco no público infantil "pelo reconhecimento que a rede neural subjacente ao controle atencional, a qual envolve o cingulado anterior e as áreas pré-frontais, tem seu desenvolvimento de forma mais intensa nesse período de vida, mais fortemente, entre 3 e 7 anos" (Rueda et al., 2005). 

Objetivo

O presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão sistemática da literatura sobre os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas na infância, incluindo trabalhos que utilizam-nos para o treinamento cognitivo ou avaliem os efeitos da interação com os jogos sobre o desempenho das habilidades que integram as funções executivas em crianças. 

Método

O levantamento bibliográfico foi realizado nas bases de dados Eric, LILACS, ScienceDirect e Scielo por meio das seguintes palavras-chave: digital games AND executive functions; child AND games AND executive functions, como exemplificado no Esquema 1. Foram definidos os seguintes critérios para inclusão: o artigo ser empírico e publicado em inglês, português ou espanhol; o artigo ter sido publicado no período de janeiro de 2012 a janeiro de 2017; indicar o uso de jogos para o aprimoramento ou exercício das funções executivas ou avaliar os efeitos do uso dos jogos sobre as funções executivas. Foram excluídos: estudos com alta especificidade que impedisse sua generalização, bem como artigos teóricos ou de revisão sistemática ou artigos que utilizaram os jogos apenas para a avaliação das funções executivas.
Esquema 1 - Levantamento Bibliográfico
Levantamento bibliográfico
Por meio das palavras-chave foram identificados 25 artigos nas bases de dados especificadas anteriormente, e de acordo com os critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 6 artigos para análise. Na análise dos artigos foram tratados os seguintes itens: abordagens teórico-conceituais que fundamentaram o estudo das funções executivas; procedimentos e instrumentos adotados para a avaliação da relação entre os jogos digitais e as funções executivas em crianças; características das amostras estudadas e os principais resultados obtidos.

Resultados

Como citado anteriormente, foram identificados 6 artigos preenchendo os critérios de inclusão. A Tabela 1 descreve os estudos em relação aos seguintes aspectos: identificação que será usada para se referir àquele artigo, título, autores, ano de publicação e revista.
Tabela 1 – Dados de identificação dos artigos incluídos.
ID
Título
Autores
Ano
Revista
1
Correlation between videogame mechanics and executive functions through EEG analysis
Tania  Mondéjar, Ramón Hervása, Esperanza Johnson, Carlos Gutierrez, José Miguel Latorre
 2016
2
Computer games that exercise cognitive skills: What makes them engaging for children?
Dragana Martinovic, Gerald H. Burgess, Chantal M. Pomerleau,  Cristina Marin
2016
3
Desenvolvimento de uma versão computadorizada da Children's Gambling Task (CGT) para avaliação da tomada de decisão afetiva em crianças pré-escolares brasileira
Fernanda Mata, Isabela Sallum, Paulo Henrique Paiva de Moraes, Débora Marques Miranda, Leandro Fernandes Malloy-Diniz
2013
Estudos de Psicologia
4
Hacia la elaboración de criterios para la estimulación de la flexibilidad cognitiva mediante juegos digitales: aportes fundados en un estudio empírico
Mauricio Cervigni, Franco Bruno, Guillermo Alfonso
2016
5
Executive Functions Development and Playing Games
Ana Lucia Petty, Maria Thereza C. Coelho de Souza
2012
US-China Education Review
6
Jogos Digitais na Escola: aprimorando a atenção e a flexibilidade cognitiva
Daniela Karine Ramos,  
Fabio Rafael Segundo

2017
Os dados descritivos dos métodos utilizados nos estudos sobre os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas na infância, entre os anos de 2012 e 2017, como: tipo de pesquisa, amostra, procedimento metodológico e instrumento serão apresentados na Tabela 2.
Tabela 2 - Dados descritivos dos métodos utilizados nos artigos incluídos.
ID
Tipo de pesquisa
Amostra
Procedimento
Instrumento
1
Experimental
12 crianças entre 8 e 12 anos
Duas fases: 1) definição de um modelo cognitivo que consistiu em padrões neurológicos de FE's; 2) os participantes jogaram videogames por 40 min enquanto os dados do EEG eram gravados
Fase 1) Testes trilhas, arruelas e interferência.
Fase 2) EEG gravados
2
Experimental
41 crianças entre 7 e 12 anos
Após passarem por uma avaliação neuropisocológica as crianças jogavam 15 jogos de computador individualmente por um período de 1,5h à 2,5h, com pausas para lanche e descanso
Escala de Observação com oito itens: prazer, frustração,  dificuldade em entender, atenção, distração, necessidade de encorajamento, comportamento ansioso ou nervoso, esforço
3
Experimental
137 crianças entre 3 e 5 anos
Metade das crianças foramprimeiro avaliado com o CMMS, enquanto a outra metade iniciou osessão com a CGT-Br. As crianças foram autorizados a fazer uma pequenapausa entre as duas tarefas
Columbia Mental
Maturity Scale (CMMS) e   Children´s Gambling Task-Br (CGT-Br)
4
Experimental
40 crianças com média de idade de 7 anos
Instrumentos da coluna ao lado, utilizados na ordem descrita.
1) Inquérito Domiciliar Permanente (Instituto Nacional de Estatística e Censo, 2011) 
2) Teste de Corvo - Escala Colorida
3) Bateria Neuropsicológica Digital SESH, sub-testes de amplitude de memória visual (AMV), atenção sustentada simples (ASS), atenção concentrada (AC), Stroop (ST) e Wisconsin (WSCT)
5
Levantamento de campo
Grupos de 12 crianças de 7 a 11 anos
As crianças são vistas no laboratório durante uma hora a cada semana, e leva cerca de três semestres para completar um ciclo que inclui a seqüência jogo-intervenção-jogo
Não foram usados instrumentos para validação
6
Quase experimental
100 crianças entre 7 e 9 anos
Uso dos jogos da Escola do Cérebro em sala de aula, utilizando um tablet individual, todos os dias úteis por 15 minutos, por um período de seis semanas
Teste de Atenção Concentrada (D2) e Teste de Trilhas, aplicados pré e pós intervenção
A Tabela 3 apresenta uma breve descrição dos objetivos dos artigos analisados, os jogos utilizados e os principais resultados encontrados. No Gráfico 1 observa-se o comparativo do número de citações dos artigos incluídos, e no Gráfico 2 os países em que foram realizadas as pesquisas.
Tabela 3 – Descritivo dos artigos incluídos.
ID
Objetivo
Jogo
Resultado
1
Como os videogames de ação podem ser projetados para desenvolver habilidades cognitivas relacionadas ao funcionamento executivo?
Alunos da Universidade de Castilla-La Mancha desenvolveram um conjunto de videogames simples focados em mecânica de ação específica (videogames de ação)
Concluiu-se que durante as avaliações e o uso de videogames, o cérebro usa as habilidades localizadas na área frontal de forma mais significativa
2
Entender melhor como as crianças interagiram com os jogos, quais jogos e quais recursos de jogos eles preferiam e qual seu nível de engajamento relacionado às pontuações dos jogos
Foram utilizados 15 jogos de computador (ver Martinovic et al., 2015, para uma descrição de cada jogo de computador que foi usado neste estudo)
As crianças tiveram melhor desempenho nos jogos em que eles estavam mais envolvidos, bem como as crianças mais jovens pareciam ficar mais frustradas e terem mais dificuldade em entender alguns jogos de quebra-cabeças, os quais requerem funções executivas, como planejamento, raciocínio ou resolução de problemas
3
Desenvolver uma versão computadorizada da CGT para a avaliação do desenvolvimento da tomada de decisão afetiva em pré-escolares brasileiros
Usou-se uma versão brasileira do Children´s Gambling Task-Br (CGT-Br), as diferenças entre a versão original da tarefa e a versão brasileira está em sua aplicação, a versão original é aplicada manualmente, enquanto a versão brasileira foi aplicada no computador. A recompensa utilizada foram M&Ms
A análise do desempenho individual identificou que há grande variabilidade no desempenho de crianças na CGT-Br em cada dos grupos etários
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Delinear diretrizes para a seleção de jogos digitais aplicáveis à estimulação da flexibilidade cognitiva contemplando os resultados de uma avaliação cognitiva de escolares e articulando-os com a bibliografia referente a tal construto
Teste de Corvo - Escala Colorida
A concentração da atenção é uma condição sine qua non para a detecção de mudanças de regras; a inibição de padrões de resposta anteriores e inadequados constitui o próximo passo; manter a atenção em trabalho penoso e regras repetitivos é uma tendência a perseverança que não é funcional em primeiro lugar; suposição que a aplicação de diretrizes estáticas não seria relevante quando se pretende modular a flexibilidade cognitiva
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Quais são as interseções entre os jogos e o desenvolvimento das funções executivas? Podemos estimular crianças com dificuldades de aprendizagem para construir habilidades relacionadas ao funcionamento executivo em um contexto de jogos e situações de resolução de problemas?
Mastermind, Pick Up Sticks, Dominó, Mancala (jogo africano), Snakes e Ladders entre muitos outros
Não foram analisados pelos autores.
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Avaliar os efeitos do uso da Escola do Cérebro no contexto sobre o desempenho das funções executivas de atenção e de flexibilidade cognitiva
Jogos da Escola do Cérebro: Connectome, Joaninha, Breakout, LookTable e Genius
Podemos ter contribuições ao utilizar jogos digitais para o aprimoramento das habilidades cognitivas, por suas características que envolvem a repetição de ações visando o melhor desempenho, a análise de situações, o planejamento de estratégias, a retenção de informações para o cumprimento de metas, a tomada de decisão, entre outras tantas ações que se pautam no uso de diversas funções cognitivas, em especial, das executivas
Gráfico 1 - Número de citações dos artigos incluídos.
Número de citações dos artigos incluídos
Gráfico 2 - País do desenvolvimento da pesquisa.
País do Desenvolvimento da Pesquisa

Discussão

O objetivo desta seção é apresentar os detalhes do estudo realizado e as informações coletadas durante o processo de classificação destes artigos. São apresentados diversos gráficos para organizar estas informações e fornecer subsídios para alcançar os objetivos citados anteriormente.
No Gráfico 3 pode-se observar uma análise das idades das crianças utilizadas como objeto de estudo dos artigos selecionados. Do lado esquerdo encontram-se as idades analisadas e do lado direito encontram-se em quantos artigos essa idade foi estudada. É possível perceber que a maioria dos estudos são voltados para crianças de 7, 8 e 9 anos, tendo uma presença de 17% cada uma, seguido de 10 e 11 anos, com 13%. Nenhum dos estudos selecionados apresentou pesquisas voltadas para a idade de 6 anos, para maiores de 12 anos ou para menores de 3 anos.
As pesquisas sobre os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas na infância são recentes. Dos 6 artigos analisados, o mais antigo foi publicado em 2012. Observou-se um aumento significativo nos últimos anos relacionado as publicações. No Gráfico 4 é possível observar que em 2016 o número de estudos publicados foi mais que o dobro que em 2012 e 2013.
Gráfico 3 – Idade classificada de acordo com o número de artigos que as utilizou em seus  estudos.
Idade classificada de acordo com o número de artigos que as utilizou em seus  estudos
Gráfico 4 – Estudos classificados de acordo com o ano de publicação.
Estudos classificados de acordo com o ano de publicação.
Após a leitura dos estudos selecionados, foi possível identificar três objetivos principais que foram enfatizados pelos autores: (1) Avaliar e compreender como os videogames podem desenvolver as habilidades cognitivas, mais especificamente as funções executivas; (2) Entender como as crianças interagem com os jogos eletrônicos; (3) Desenvolver uma versão computadorizada da CGT para a avaliação do desenvolvimento da tomada de decisão afetiva. Além dos objetivos discutidos em cada artigo, também é importante caracterizar os tipos de pesquisa realizados pelos trabalhos analisados neste mapeamento, como pode ser observado no Gráfico 5. É possível perceber que a maior parte  dos artigos selecionados (66,6%), teve  como tipo de pesquisa a experimental, enquanto uma parcela menor (16,6%) utilizou o levantamento de campo e, outra parcela (16,6%)  utilizou-se da quase experimental.
Gráfico 5 – Estudos classificados de acordo com o tipo de pesquisa.
Estudos classificados de acordo com o tipo de pesquisa
Por fim, foi possível identificar cinco resultados principais que foram enfatizados pelos autores: (1) Durante o uso do videogame o cérebro usa principalmente as habilidades localizadas na área frontal; (2) Quanto mais envolvida no jogo a criança estiver, melhor será o seu desempenho; (3) O desempenho obtido em cada jogo varia conforme a faixa etária; (4) Jogos eletrônicos contribuem para o aprimoramento das habilidades cognitivas; (5) O impacto da atenção na realização das tarefas. Desse modo, segue-se o estudo realizando-se uma breve síntese dos resultados obtidos em cada um dos artigos selecionados.
Segundo Mondejár et al. (2016), foi comprovada uma atividade claramente proeminente no nível pré-frontal do cérebro que está relacionada às funções executivas, realizada em três das cinco mecânicas analisadas. As duas mecânicas que não se enquadram nessa categoria são a ação precisa e a mecânica de seqüências mímicas, durante a qual, no primeiro caso, a atividade cerebral é mais global e com maior presença de ondas alfa, e o segundo caso tem uma maior ativação do lobo temporal. Tendo evidenciado a proeminente atividade relacionada às FE no nível cerebral, pode-se corroborar a hipótese que afirmava o desenvolvimento de FE usando videogames de ação, particularmente videogames, incluindo as três mecânicas mencionadas. Tal desenvolvimento é sustentado por teorias clássicas que afirmam o desenvolvimento de habilidades cognitivas através do uso contínuo de componentes cerebrais relacionados, e estudos experimentais mais recentes sobre esse assunto, por exemplo.
Martinovic et al. (2016), geraram uma definição operacional de "Engajamento", que compreende oito componentes. Através da Escala de Observação, foram capazes de medir de forma confiável e válida o constructo através de comportamentos observáveis ​​das crianças. A medida que desenvolveram foi sensível o suficiente para detectar variações ou diferenças no engajamento entre jogos com diferentes qualidades. Dos comentários feitos pelas crianças durante e após o brincar, a presença ou a ausência de engajamento foi evidente e essas conclusões foram congruentes com as pontuações dos jogos. De forma geral, o estudo mostrou que as crianças tiveram melhor desempenho nos jogos em que elas estavam mais envolvidas, indicando a importância para os jogos de computador "cognitivamente responsáveis", qualidade que os tornam atraentes. Além disso, as crianças mais jovens pareciam ficar frustradas e possuírem dificuldade em entender alguns jogos de quebra-cabeças, o quais geralmente envolvem funções executivas, como planejamento, raciocínio ou resolução de problemas; habilidades cognitivas que estão apenas começando a se desenvolver entre 7 e 8 anos de idade. 
Para o artigo de Mata et al. (2013), uma das descobertas foi que a análise do desempenho individual mostrou que há grande variabilidade no desempenho de crianças na CGT-Br em cada um dos grupos etários. Mata et al. (2013) também afirma que o desempenho superior de crianças de quatro e cinco anos, na tarefa do presente estudo, pode ser interpretado considerando o desenvolvimento de componentes frios de funções, como memória de trabalho e controle inibitório, bem como outras funções executivas predominantemente quentes, como aprendizagem de reversão, que são importantes para o desempenho no CGT.
Cervigni, Bruno e Alfonso (2016) consideram que as correlações encontradas poderiam ser importantes ao estabelecer critérios para a seleção de jogos digitais orientados ao estímulo da flexibilidade cognitiva, pois parecem sugerir que: 1) a concentração de atenção é condição sine qua non para a detecção de mudanças de regras; 2) a inibição de padrões de resposta anteriores e inadequados constitui o próximo passo. Verificou-se também que os videogames de ação em primeira pessoa (First Person Shooter) estimulam a flexibilidade cognitiva, reduzindo a dificuldade em mudar de tarefas (Task Switching Cost). Os autores atribuem esse resultado ao fato de que videogames modernos dessa categoria não apenas exigem a capacidade de "disparar" em um momento preciso, mas também integram cenários e elementos contextuais que aumentam e enriquecem a variabilidade da situação de estímulo.
Nesse sentido, os resultados descritos no estudo de Ramos e Segundo (2017), revelam que podemos ter contribuições ao utilizar jogos digitais para o aprimoramento das habilidades cognitivas, por suas características que envolvem a repetição de ações visando o melhor desempenho, a análise de situações, o planejamento de estratégias, a retenção de informações para o cumprimento de metas, a tomada de decisão, entre outras tantas ações que se pautam no uso de diversas funções cognitivas, em especial, das executivas. 

Considerações Finais

A partir dos resultados encontrados nos artigos selecionados para este estudo, podemos concluir que os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas variam de acordo com o tipo de jogo utilizado, como salientado por Mondejár et al. (2016), que constatou que jogos de ação oportuna, aprendizagem de padrões e quebra-cabeças lógicos têm um efeito maior nas FEs e, também mencionado por Cervigni, Bruno e Alfonso (2016), que afirmam que videogames de ação em primeira pessoas estimulam a flexibilidade cognitiva. Também pode-se concluir que a faixa etária é de fundamental importância no desempenho do jogo, como afirmam Mata et al. (2013), que constatou o desempenho superior de crianças de quatro e cinco anos na tarefa determinada, fator também mencionado por Martinovic et al. (2016), que afirmam que as crianças mais jovens pareciam ficar frustradas e ter dificuldade em entender alguns jogos de quebra-cabeças, o quais geralmente envolvem funções executivas.
Vale salientar que as pesquisas sobre os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas na infância são recentes. Dos 6 artigos analisados o mais antigo foi publicado em 2012. Observou-se um aumento significativo nos últimos anos relacionado as publicações, tendo a maioria dos artigos selecionados para este estudo sido publicados no ano de 2016. Entretanto, somente um conjunto limitado de base de dados foram utilizados, portanto, é possível que estudos relevantes não tenham sido incluídos. Para garantir um processo de seleção imparcial, as questões de pesquisa e os critérios de inclusão e exclusão foram criados antes do início do mapeamento.

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